domingo, 6 de maio de 2012

Vida



Tão estranho como as pessoas têm medo da morte. Cada vez que escrevo sobre ela, sinto como se mil olhos me perfurassem exigindo meu silêncio.  Errado enaltecer o fim, errado buscar uma renúncia.
Mas... Ironicamente leio tantos textos cuspindo sangue, reverenciando a dor, alguns até mesmo se orgulham do desejo de matar por motivos futeis... Sinceramente, cada um sabe de si, cada um sabe do sangue que corre e escorre das veias rumo sempre, sempre ao mesmo rio... Não, não o de lágrimas, das larvas. Mas é intragável o ar de superioridade que alguns deixam escorrer sobre o que desconhecem ao enaltecerem ou escarnecerem vida e morte.

Mas tambem eu, um dia ou dois ou três,  vi-me em um tênue fio entre a vida e a morte, não, não muitas vezes, algumas vezes. As tarefas inacabadas sempre me impediram de dizer à ela, a morte: Estou pronta...
Grande bobagem. Hoje sei, que elas nunca findam, as tarefas...
Cedo ou tarde, deixaremos esse engôdo, esse lodo, talvez para buscar morada em um pior, mas é inevitável a despedida, o que fazemos vezes ou outra é protelar. E nessa despedida sempre haverá o assoalho que ficou sem varrer, o beijo que não foi dado, a chaleira no fogo, aquele livro sem um fim, o vazio da alcova... A palavra não dita...

Voltando aos escritos que leio aqui e ali... Fico a imaginar se alguns escritores sabem exatamente o que é dor, o que é sangrar literalmente, o que é ter a carne lanhada, o que é ter a alma escurraçada para o exilio de si mesma... Acho que não. Ainda que sofressessem dores emocionais, não vislumbro neles feridas na carne, feridas em outdoors, feridas nojentas que acolhem o que tem de pior, a piedade, a subserviência, a lenicência em troca de lenitivos. Não, acho que não conhecem o gosto de sangue entre os dedos, entre as coxas, entre os pés, entre os dentes, entre os ossos... Não, não conhecem.

Talvez por isso sinta um desprezo tão grande por essa gente que se enche de revolta e que fugiria covardemente de serem sangrados em vida, mas que insistem em pixar murais e mais murais com um vermelho literal que só conhecem em metáforas. Que piada... Mas é bonito, oras, se é... O vermelho atrai, o sangue fascina. Pessoa já dizia que o poeta é um fingidor...

Do sangue de volta à vida e à morte... De volta à hipocrisia de se escrever o que não se sente, de se escrever do corte que não houve, do carmim que só foi visto ao vivo e a cores em uma tela, em uma janela, em uma página de um site. Afinal isso é vida ainda que finja ser morte, é vida...

E eu hipocritamente vou fingir que desconheço da vida, a morte, por enquanto...


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