segunda-feira, 18 de maio de 2015

abandono


acordou tão cedo o sol
e ela, a carne, esqueceu-se
estendida nos lençóis

pra que descer do sono
se nada há debaixo
da cama

nem bicho papão
nem dedos, nem anéis
nem papai noel

só um tapete
de esperas, sem flores,
e sem janelas...

domingo, 17 de maio de 2015

utopias

e, se é domingo
sinto nos ombros e nas palavras
o velho peso das cinzas

ah, esses olhos idos
que fitam-me e acusam-me
da morte do amanhã

ah, essa culpa
de não ter feito buscas
entre a dúvida e as maçãs...

quarta-feira, 13 de maio de 2015

e ponto


















porque
não é fácil
parir cicatrizes
e abortar
sem raízes...

volta e meia
meia lua
luas tantas
a poesia
escavo

e abro
e desentupo
meus ralos
a céu
aberto

e finjo
um feto
um filho
um neto
um verso...

terça-feira, 12 de maio de 2015

sei...

quanto mais leio
mais medo tenho

medo do que não sei
medo do que acho que sei

medo de nunca
vir a saber

e pensar
que sei...

sábado, 9 de maio de 2015

instinto...


se minhas mãos
não servem para o plantio
para a colheita maldita ou santa
do arroz ou do cipreste

não tem a lida da enxada
mordendo e procriando a terra
essa mulher, ora séria, ora prostituta
mãe, desejo e morte de tantos

que sejam úteis
ainda que tenham dúvidas
que sejam limpas
ainda que estejam sujas

se forem de poesia
ah, deuses, que iguaria
não desejo muito
só uns versos filhos

mas, se forem matriarcas
de famílias de gente ou de bicho
que sejam mais alma
do que  dna e carne...



aconchego

uma faca
um espinho, um caco
de vidro... um grito...

e aquela dor
tão bem aninhada
na carne ainda viva

feito criança na barriga


terça-feira, 5 de maio de 2015

rabiscos

abstenho-me
do poema

em fase
de versos anoréxicos

qualquer pingo
é letra...

sábado, 2 de maio de 2015

feto


o verbo
faz-se servo
entre o ventre
e o verso

e em silêncio
no útero das palavras
a poesia ganha
asas